Exílio no Uruguai: Doença e morte de João Goulart
Após rápida passagem por Porto Alegre, onde encontrou seu cunhado Leonel Brizola, o ex-governador do Rio Grande do Sul e então deputado federal pelo PTB da Guanabara, João Goulart decidiu partir para o exílio, chegando a Montevidéu no dia 4 de abril de 1964. No Uruguai, recebeu diversas manifestações de solidariedade do Brasil e do exterior, principalmente vindas de países da América Latina, entre os quais Chile, Argentina e Uruguai.
Durante seu período de exílio, o ex-presidente se correspondeu com vários políticos, mantendo-se informado sobre a conjuntura política do país e sobre as medidas de exceção tomadas pelos militares logo após o golpe. Parte da correspondência com um desses políticos, Doutel de Andrade, refere-se ao Inquérito Policial Militar (IPM) a que Goulart foi submetido e que resultou em seu indiciamento como principal responsável pelos crimes arrolados no processo, em 1969. A sindicância desenvolvida pelo regime militar, iniciada ainda em 1964, visava a averiguar possíveis irregularidades em seu patrimônio material. O processo, com 19 volumes de documentos, concluiu que o ex-presidente havia cometido crimes contra o Estado e a ordem política e social, tais como "corrupção administrativa; aplicação indevida do dinheiro público; concessão de vantagens, favores e privilégios a apadrinhados e a organizações de classe que (...) conturbavam a vida nacional (...); diluição do princípio de autoridade e solapamento das instituições" (JG e 1969.06.02).
Em uma das cartas enviadas a Doutel, em 4 de maio de 1964, logo nos primeiros tempos do exílio, Goulart revela que "com profunda mágoa, tomo conhecimento da opressão, injustiças e violências praticadas contra o povo e contra as pessoas que cometeram o único crime de serem meus amigos ou de apoiarem minha orientação, que entendiam certa para os destinos do país". Mais adiante, nessa mesma correspondência, referindo-se a uma matéria publicada por um jornal de Porto Alegre relativa ao seu patrimônio, afirma que se sentia no dever de "enviar alguns rápidos esclarecimentos (...) que servem para desmascarar a miséria moral do seu autor". Em seguida, fornece informações detalhadas sobre a origem dos seus bens, segundo ele, todos adquiridos até 1961, ano em que assumiu a presidência da República. Afirma ainda que algumas das propriedades em Mato Grosso, a ele atribuídas pelo jornal, nunca constaram do seu patrimônio e conclui solicitando que todos os dados fornecidos fossem publicados, se possível, como matéria paga (JG e 1964.04.04/2).
Nesses cinco anos de investigações e acusações, sem poder usar o direito de defesa e sem que seus advogados tivessem acesso aos autos, Goulart se deprime, adoece e envelhece precocemente, como demonstram alguns dos documentos encontrados no seu arquivo pessoal, inclusive fotografias. Em correspondência dirigida a um deputado estadual do Rio Grande do Sul, em agosto de 1964, comenta seu estado de saúde, dizendo que já se encontra em fase de recuperação e que já retomou a leitura dos "jornais da terra" (JG e 1964.04.04/12). A referência feita diz respeito às complicações cardíacas que surgiram nesse período e que o perseguiram até a sua morte em 1976.
Nesses 12 anos, concedeu várias entrevistas a jornalistas brasileiros e estrangeiros e recebeu relatórios semanais de ex-colaboradores, como José Gomes Talarico, com informações sobre a conjuntura política e a atuação dos militares e dos políticos, inclusive da oposição. Entre 1966 e 1968, tomou parte das articulações relativas à constituição da Frente Ampla, movimento que visava à restauração democrática do país, por meios pacíficos, e do qual também participaram Carlos Lacerda e Juscelino Kubitschek.
Jango passou a residir em Buenos Aires em 1973, a convite do então presidente Juan Domingo Perón. Faleceu na sua fazenda La Villa, no município argentino de Mercedes, vítima de um ataque cardíaco, sem ter conseguido regressar ao Brasil. Sua morte teve grande repercussão tanto no Uruguai como no Brasil, a despeito da censura imposta ao noticiário relativo ao fato. Goulart foi sepultado em sua cidade natal, São Borja. O cortejo foi acompanhado por cerca de 30 mil pessoas, entre as quais políticos oposicionistas e antigos colaboradores de seu governo.
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